A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) se posicionou favoravelmente à possibilidade de fundos imobiliários (FIIs) e Fiagros realizarem a recompra de suas próprias cotas no mercado secundário. Apesar de ainda não estar em vigor, a sinalização abriu discussões importantes sobre os impactos dessa medida para a indústria e, principalmente, para os cotistas.

O que está acontecendo?

A recompra de cotas, prática já comum entre empresas listadas em Bolsa, permitiria que os gestores utilizassem recursos em caixa para adquirir cotas do próprio fundo quando estivessem negociadas abaixo do valor patrimonial. A intenção seria gerar valor para o cotista ao aproveitar oportunidades de mercado — como descontos expressivos nas cotas — e melhorar indicadores como o valor patrimonial por cota (VPC).

Contudo, a recompra de cotas é atualmente vedada por lei, mais precisamente pela Lei nº 8.668/1993, que regula os FIIs. Essa legislação proíbe explicitamente que fundos apliquem seus próprios recursos na aquisição de cotas do próprio fundo. Para que a prática seja autorizada, será necessário alterar o marco legal, além de definir regras claras sobre limites, governança e transparência.

O que pode mudar para o cotista?

Se a mudança for aprovada futuramente, os efeitos para o cotista poderão ser tanto positivos quanto negativos, dependendo da forma como os gestores conduzirem as operações. Veja os dois lados da moeda:

Pontos positivos da recompra de cotas

  • Valorização das cotas: Ao recomprar cotas descontadas e cancelá-las, o valor patrimonial por cota tende a subir, beneficiando os investidores remanescentes.

  • Mais eficiência na alocação de recursos: Em momentos de escassez de boas oportunidades de investimento, a recompra pode ser uma alternativa melhor ao caixa ocioso.

  • Aumento nos dividendos: Cotas recompradas deixam de pagar proventos, o que pode elevar a distribuição para os cotistas restantes.

  • Maior utilidade para o caixa: Mesmo os 5% de resultado que os fundos não são obrigados a distribuir poderiam ganhar nova utilidade ao financiar recompras programadas.

Riscos e pontos negativos

  • Conflito de interesses: Gestores podem priorizar recompra em detrimento de novos investimentos apenas para inflar cotas e aumentar taxas de administração atreladas ao valor de mercado.

  • Manipulação de mercado: A prática poderia ser usada de forma oportunista, com emissões seguidas de recompra para ganhos internos.

  • Descaracterização dos FIIs: Caso a regra de distribuição mínima de 95% dos lucros seja flexibilizada no futuro, a essência de geração de renda dos fundos pode ser comprometida.

  • Transparência e governança: A ausência de regras claras pode abrir margem para distorções e prejudicar a confiança dos investidores.

Quando a mudança pode entrar em vigor?

A ata da reunião da CVM que discutiu a possibilidade deve ser publicada em até 30 dias, mas não há prazo definido para a regulamentação efetiva da recompra. Antes disso, será necessário resolver as questões jurídicas e adaptar a legislação vigente.

Comparação com o mercado acionário

No mercado de ações, a recompra é amplamente utilizada como uma forma de remuneração indireta ao acionista. Empresas como Ambev, Cyrela e Banco ABC têm programas ativos de recompra registrados na B3. A lógica seria semelhante nos FIIs, mas adaptada à estrutura e às restrições legais específicas desse tipo de veículo.

 Oportunidade ou ameaça?

A recompra de cotas pode ser um avanço relevante para aumentar a eficiência e a atratividade dos fundos imobiliários, desde que implementada com regras claras, limites definidos e forte governança. Para os cotistas, o momento é de atenção: mais poder nas mãos dos gestores exige ainda mais critério na escolha dos fundos.

No cenário ideal, a mudança serviria como uma ferramenta a mais para entregar valor ao investidor. No pior cenário, pode gerar distorções e favorecer práticas oportunistas. A forma como o mercado lidará com essa nova possibilidade — se aprovada — definirá seu impacto de longo prazo.

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Suzana Santos é economista formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e especialista em Finanças e Gestão Pública pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Com mais de 10 anos de experiência em análise de políticas econômicas e benefícios sociais, Suzana se destaca por sua habilidade em traduzir temas complexos em informações acessíveis e úteis para os leitores.No O Petróleo, Suzana contribui com artigos que abordam desde investimentos e planejamento financeiro até programas de benefícios sociais, sempre com foco na educação financeira e na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Sua visão estratégica e compromisso com a excelência informativa fazem dela uma peça essencial na equipe editorial.